quarta-feira, 20 de janeiro de 2016

Os Casarões de Minha Vida - A Casa dos primeiros 10 anos: recordações e mudanças

Os Casarões de Minha Vida
Casarão São Jerônimo 267
28 de Setembro 982















1. A Casa dos primeiros 10 anos: recordações e mudanças


Morei na Avenida São Jerônimo desde quando nasci, em 1944, até o ano em que casei, 1968. Ainda que a rua tenha tido seu nome alterado para Governador José Malcher, quando eu tinha doze anos, em 1956, nunca consegui assimilar tal troca. Continua sendo para mim, eternamente, a Avenida São Jerônimo. No decorrer destes quase 24 anos em que lá morei presenciei várias transformações nos costumes e hábitos da cidade.
Nos meus primeiros 10 anos de vida, moramos em uma casa entre as Travessas Quintino Bocaiúva e Rui Barbosa, onde hoje é o Edifício João Cardoso Figueiredo. Lembro das carroças com vasilhames de leite vendendo diariamente de porta em porta o líquido freco oriundos das vacarias espalhadas pela cidade; recordo dos carrinhos de mão que em junho perfumavam a cidade oferecendo ervas para os banhos de cheiro e coroas juninas para nos coroarmos; das carrocinhas que recolhiam os cachorros que vagavam sem dono pelas ruas e que se não procurados seriam queimados no forno crematório, existente na Alcindo Cacela, Bairro da Cremação. Todos costumes que já não exitem. A rua era o lugar de reunião da criançada, para o passeio de bicicleta, de patins, das brincadeiras de bonecas e seus instrumentais para as meninas e dos revolveres de espuleta, espingarda de chumbo, ou baladeira para os meninos, exibidos orgulhosamente quando ganhos no Natal ou nos aniversários. Eu nunca tive bicicleta, meu pai achava imprópria para meninas. Meus dois irmãos mais velhos tinham, minhas primas que moravam em frente a nossa casa, também. Assim aprendi a andar na bicicleta dos outros, mas sem muita destreza. Nas calçadas fazíamos os desenhos para pular macaca, brincar de cemitério, jogar bola de gude (petecas) com os meninos e brincar de roda com as meninas. A vizinhança se conhecia e se curtia, principalmente as crianças e os pré-adolescentes. Os dois quarteirões eram compostos de casas residenciais e mercearias, uma em cada quarteirão, na esquina da Rui Barbosa, O Combate, existente até hoje e na esquina com a Quintino Bocaiúva, a Mercearia Ninho, que atendia pedidos, a crédito, pelo telefone e mandava deixar em casa. Neste perímetro moravam algumas pessoas depois ilustres na história da cidade, o Coronel Alacid Nunes, em frente à casa de sua futura esposa, Marilda, da família Abel Figueiredo e ao lado da família de Machado Coelho. Estas casas encontram-se ainda hoje preservadas. Chamava atenção na esquina da Rui Barbosa, o conjunto de vários casarões de dois andares que lá permanecem, conforme se observa na foto retirada de postagens no face. Mais próxima a nossa casa outras famílias e pessoas que ainda lembro: Leônidas Figueiredo e Amaral Costa; João Figueredo que mais tarde compra a casa em que morávamos e constrói o edifício que leva seu nome, os Viana, Hélio e Siussi Mokarzel, Célio Lobato, Hildemar Tamegão Lopes e Alexandre Yamanuchi.
O que mais retenho na memória deste período é nossas brincadeiras de criança na calçada, ou dentro de casa, jogando peteca ou bola com meus dois irmãos, muitas vezes trazendo prejuízo e quebrando vasos que ficavam no corredor, então nosso campo de futebol, ou brincadeira de boneca com minhas tias quando estas estavam em casa. Geralmente, em função do prejuízo ou de alguma desobediência ou malcriação, nosso castigo era escrever linhas, tipo “Não devo desobedecer minha mãe”, umas quinhentas vezes.
O fato político do período em que moramos na primeira casa que trago gravado na memória é um comício no Largo do Redondo, esquina de Nazaré com Quintino Bocaiúva. Portanto, em uma das esquinas do quarteirão em que ficava nossa casa. Início da década de 50, concorrendo à eleição para governo do Estado o General Magalhães Barata (PSD – Partido Social Democrata) e General Zacarias de Assumção (UDN – União Democrática Nacional). Ficamos todos em casa, três crianças, eu e meus dois irmãos, com uma empregada, e meus pais foram assistir o comício. Eu era muito criança, seis anos, mas lembro do medo que ficamos quando ouvímos os disparos de armas e o barulho de correria na rua. Quando nossos pais chegaram soubemos que um rapaz fora atingido por uma bala perdida da polícia e que na correria para fugir do tumulto e preocupados com as crianças que haviam ficado em casa, minha mãe caíra, tendo meu pai dificuldade de protegê-la para não ser pisoteada pela multidão que se deslocava na mesma direção, da Avenida Nazaré para a São Jerônimo, pela Quintino. O estudante atingido foi Osvaldo Caldas Brito, aluno do Colégio Estadual Paes de Carvalho que saíra do colégio com colegas para assistir ao comício e que veio a falecer com o incidente. Tal fato teve enorme repercussão, contribuindo para a derrota de Barata ao Governo. Lembro do símbolo usado na campanha, a chinela, e dentre as marchinhas carnavalescas que marcaram a disputa entre os dois políticos:
“Oh! xente que bicho é este
É o Barata
Oi, pega na chinela e mata”

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